É um daqueles cafés charmosos, não muito arrumados, não muito comuns. O lugar é bem agradável e o cappuccino é delicioso. Está calor lá fora, eu sei. Mas é que ele realmente é muito bom. Pois bem. Estou sentada com um cara que conheci há pouco mais de uma hora, amigo de um colega meu. Ele disse que ia nos apresentar, marcou o lugar, a hora e voilà! Prático assim. Ele é interessante. Bonitinho, nenhum galã. Parece ser mais ou menos certinho. Nem o amor da minha vida, nem o cara dos meus sonhos, nem uma paixão avassaladora. Ainda bem, não estou com cabeça - nem coração - para essas coisas no momento. Podemos nos divertir juntos. Ele tem um papo legal, pelo menos nessa conversa de uma hora.
"Então, me fale um pouco mais de você", ele diz. Oh-oh, terreno difícil. Ele tem um sorriso encantador no rosto, e me incentiva a continuar. "Tenho 19 anos, uma irmã mais nova e pais superprotetores", eu digo. Essa parte é fácil de falar. "Não tenho certeza se estou no curso certo. Já quis viver de arte, e desisti antes de me arriscar. Doeu bastante", minha voz é baixa, como que admitindo um certo fracasso. "Esperava demais de mim mesma. Hoje tento não esperar mais nada. Posso não ir tão longe, mas me decepciono menos". Ele sorri com compreensão. Não faça isso, agora eu vou tagarelar.
"Já me apaixonei, mas só uma vez. Não deu certo, nunca dá. E eu sou meio boba e continuo tentando", eu mesma rio. "Choro muito fácil. Dou gargalhadas estranhas. Como feito louca, e tenho uma dificuldade enorme para engordar". Isso faz com que ele ria, então continuo. "Mudo de assunto muito fácil, difícil é me fazer parar de falar. Amo conversar. Agora me fala um pouco de você".
"Nossa, você abriu o coração. Assim, de primeira. Não sei fazer isso". Não sei se ele estava fazendo charminho ou se era mesmo simplório de emoções. Se aquilo fosse abrir o coração, apenas uma junção aleatória de períodos simples, que qualquer um veria em mim se tentasse me descobrir, então eu seria tão rasa quanto um espelho d'água. Escondo essa primeira decepção, sorrio de leve e digo, como quem não quer nada: o que você está pensando agora? Ele respira fundo, olha para os lados, olha novamente para mim, abaixa o olhar e enfim abre a boca. "Hum, estou pensando que esse cappuccino é muito bom, mas que você tem que provar a torta de limão. E também estou pensando que, pela primeira vez na vida, foi bom ter seguido um conselho do Caio (nosso amigo em comum), ao invés de nunca entrar por aquela porta. E estou na dúvida do que significa essa tatuagem".
Eu olho para meu pulso e não consigo evitar soltar uma risada. Podia dizer que vou provar a torta de limão, podia dizer que também gostei de ter vindo, mas tenho que contar sobre a tatuagem. "Algumas das minhas amigas têm tatuagem, mas eu sempre disse que não teria coragem de fazer, que provavelmente enjoaria do desenho e que não queria vê-lo se enrugar. Mesmo assim, eu também dizia que, fora tudo isso, se um dia fosse fazer, faria isso. E aí elas perguntavam 'por quê?', e eu explicava que parece com uma interrogação, para representar a dúvida, a incerteza; parece com a metade de um coração, para representar o amor, que ao mesmo tempo não está completo, porque eu sou uma só, e metade; e parece com um pedaço do símbolo do infinito, para representar a eternidade, uma busca incessante, mas que, por não estar completa, tem seu fim. É uma explicação grande para uma tatuagem", eu digo, e ele pega meu pulso para observar melhor. "É uma ótima explicação. Mas você ainda não disse porque decidiu fazê-la". Olho bem para ele. Não é a minha parte favorita da história, digamos assim. "Eu não decidi. Fui a uma festa de um pessoal da faculdade de minha amiga, só que nesse dia eu meio que tinha acabado com um cara que estava saindo, então exagerei um pouco... E quando eu acordei, ela já estava no meu pulso". Ele solta uma gargalhada.
"Sabe, você é meio doida". Não tomo como ofensa. Ele está com o sorriso aberto. "Acho isso tão legal! Quer dizer, primeiro você é a menina poética e filosófica na explicação do porque do desenho. E depois... você surge com uma história de tatuagem pós-ressaca...", a voz dele fica mais baixa, e ele não diz mais nada, só fica me olhando, a mão ainda segurando meu pulso, mesmo que não observe mais o desenho de interrogação/coração/infinito. Mantenho-me observando-o, até que percebo que estou corando, e abaixo meu rosto com um sorriso de canto de boca. É um daqueles silêncios. Um silêncio mágico, não constrangedor. Não sei quanto tempo ficamos assim, ou se a garçonete demorou muito tempo ao nosso lado até que nós percebêssemos e pegássemos a conta que ela estendia. Também não sei como de repente o relógio andara tão rápido e, quando percebi, me assustei. Olho para ele, realmente desejando não ter que dizer aquelas palavras, mas tenho que fazer isso.
"Ahn, eu tenho que ir... Tem uma palestra em quinze minutos". Espero que meu rosto consiga expressar o pedido de desculpas e a minha vontade de continuar lá. Pela expressão dele, acho que entende. Anoto o número do meu celular em um guardanapo, entrego-o e saio correndo, depois de me despedir apressadamente com dois beijinhos. Ele ainda não falou nada, e faz duas semanas. Continuo esperando, feito boba, pela saída que ele sugeriu, mas que ainda não aconteceu, e provavelmente não acontecerá mais. Continuo esperando que ele mande uma mensagem, que a gente converse, porque, sim, eu sei que foi pouco tempo, mas a conversa foi tão boa... E quando acontece alguma coisa, tenho vontade de acrescentar à descrição da minha vida e contar a ele. Talvez ele tenha perdido o guardanapo, mas eu sei que esse não é o problema. Se estivesse mesmo interessado - ou melhor, se estivesse interessado o suficiente - ele teria como pegar meu número. Talvez ele até já esteja com outra menina em um café charmoso, um cinema, uma praia ou sei lá o quê. Não dá para saber, a não ser que ele decida reaparecer das cinzas - e eu não vou perguntar ao meu amigo, não vou procurar nas redes sociais, só vou deixar o tempo - e dizer algo. Coisa que provavelmente também não vai acontecer.
Eu olho para meu pulso e não consigo evitar soltar uma risada. Podia dizer que vou provar a torta de limão, podia dizer que também gostei de ter vindo, mas tenho que contar sobre a tatuagem. "Algumas das minhas amigas têm tatuagem, mas eu sempre disse que não teria coragem de fazer, que provavelmente enjoaria do desenho e que não queria vê-lo se enrugar. Mesmo assim, eu também dizia que, fora tudo isso, se um dia fosse fazer, faria isso. E aí elas perguntavam 'por quê?', e eu explicava que parece com uma interrogação, para representar a dúvida, a incerteza; parece com a metade de um coração, para representar o amor, que ao mesmo tempo não está completo, porque eu sou uma só, e metade; e parece com um pedaço do símbolo do infinito, para representar a eternidade, uma busca incessante, mas que, por não estar completa, tem seu fim. É uma explicação grande para uma tatuagem", eu digo, e ele pega meu pulso para observar melhor. "É uma ótima explicação. Mas você ainda não disse porque decidiu fazê-la". Olho bem para ele. Não é a minha parte favorita da história, digamos assim. "Eu não decidi. Fui a uma festa de um pessoal da faculdade de minha amiga, só que nesse dia eu meio que tinha acabado com um cara que estava saindo, então exagerei um pouco... E quando eu acordei, ela já estava no meu pulso". Ele solta uma gargalhada.
"Sabe, você é meio doida". Não tomo como ofensa. Ele está com o sorriso aberto. "Acho isso tão legal! Quer dizer, primeiro você é a menina poética e filosófica na explicação do porque do desenho. E depois... você surge com uma história de tatuagem pós-ressaca...", a voz dele fica mais baixa, e ele não diz mais nada, só fica me olhando, a mão ainda segurando meu pulso, mesmo que não observe mais o desenho de interrogação/coração/infinito. Mantenho-me observando-o, até que percebo que estou corando, e abaixo meu rosto com um sorriso de canto de boca. É um daqueles silêncios. Um silêncio mágico, não constrangedor. Não sei quanto tempo ficamos assim, ou se a garçonete demorou muito tempo ao nosso lado até que nós percebêssemos e pegássemos a conta que ela estendia. Também não sei como de repente o relógio andara tão rápido e, quando percebi, me assustei. Olho para ele, realmente desejando não ter que dizer aquelas palavras, mas tenho que fazer isso.
"Ahn, eu tenho que ir... Tem uma palestra em quinze minutos". Espero que meu rosto consiga expressar o pedido de desculpas e a minha vontade de continuar lá. Pela expressão dele, acho que entende. Anoto o número do meu celular em um guardanapo, entrego-o e saio correndo, depois de me despedir apressadamente com dois beijinhos. Ele ainda não falou nada, e faz duas semanas. Continuo esperando, feito boba, pela saída que ele sugeriu, mas que ainda não aconteceu, e provavelmente não acontecerá mais. Continuo esperando que ele mande uma mensagem, que a gente converse, porque, sim, eu sei que foi pouco tempo, mas a conversa foi tão boa... E quando acontece alguma coisa, tenho vontade de acrescentar à descrição da minha vida e contar a ele. Talvez ele tenha perdido o guardanapo, mas eu sei que esse não é o problema. Se estivesse mesmo interessado - ou melhor, se estivesse interessado o suficiente - ele teria como pegar meu número. Talvez ele até já esteja com outra menina em um café charmoso, um cinema, uma praia ou sei lá o quê. Não dá para saber, a não ser que ele decida reaparecer das cinzas - e eu não vou perguntar ao meu amigo, não vou procurar nas redes sociais, só vou deixar o tempo - e dizer algo. Coisa que provavelmente também não vai acontecer.
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