Pular para o conteúdo principal

Postagens

Mostrando postagens de agosto, 2015

Alguém especial

   Lendo um daqueles textos que gosto, e ele começa a falar sobre um alguém especial. A delícia que é encontrar, a angústia da busca, o medo de deixar escapar. Eu sorrio sem perceber. Acho que encontrei o meu, finalmente.     Meu alguém especial se concentra em um metro e sessenta e três centímetros - e meio - de muitos sonhos. Meu alguém especial também já se frustrou por não conseguir realizar alguns desses sonhos, mas mantém seu sorriso, mesmo com os dentes da frente quebrados - doze vezes, acredite! - e o lábio inferior partido. Meu alguém especial não cuida muito do cabelo, mas sempre reclama que ele está inchado, amassado, que a cor está meio estranha.     Ela odeia salão, mas ama pintar as unhas com esmaltes vibrantes. Evita ao máximo usar salto alto, mas não abre mão da sandália gladiadora que faz suas pernas parecerem menos finas. Ama praticar exercícios, mas ama mais ainda a sensação do chuveiro forte sobre seu corpo depois dos abdominais, agachamentos e pulos.   

Me desculpe, mas obrigada

   Eu já fiz alguém chorar. Ponto, porque esse momento é de reflexão, e a vírgula seria rápida demais. Fiz alguém chorar e sorri por isso. Sorri muito, e quase transbordei em lágrimas. Lágrimas de alegria. Já me fizeram chorar também, e por vários motivos. Não quero saber de tristeza, e se fiz alguém chorar por isso, perdão.    É indescritível a emoção de estar em cima de um palco, com mais 10 centímetros de salto alto, olhando para uma plateia de duzentas pessoas, falando um texto que escreveu no conforto da sua solidão. É abrir demais o coração. É expor tudo que há por dentro, é deixar as lágrimas, os gritos e os sorrisos saírem em forma de palavra, a voz às vezes fraca.    Eu já esqueci o meu próprio texto, e não foi por nervosismo. Meu amor por falar em público é quase tão grande quanto o que tenho por escrever. Mas enquanto você vive o presente, procurando por alguém ali, naquela sua plateia atenta, o passado escrito no texto se esquece de que deveria ser dito. E é isso. Br

Só saudade

   Hoje acordei com saudade. Para falar a verdade, acordei com mais saudade do que não foi. Daquele fim de semana na praia com meus amigos, daquela viagem de reveillón com as meninas, daquela mensagem que eu não mandei. Acordei com saudade do show que não fui por estar doente, do jantar que não fui por causa da prova do dia seguinte. Senti saudade do intercâmbio em que não me inscrevi, dos amigos que não conheci, dos lugares que não visitei.    Acordei com uma saudade louca dos parentes que não deixei, das conversas por Skype que não aconteceram, dos voos que não fiz. Senti saudade até da saudade que não senti. Me deu aquele aperto no coração por não estar contando os dias para chegar em casa e ver todos, por não estar arrumando as malas para vir. É que eu já estou aqui, eu já pertenço a esse mundo, eu já criei raízes.     Senti saudade dos amores que não tive, das cartas que não recebi, dos presentes que não comprei. Das festas que não fui, dos estranhos com quem não converse

Dois cappuccinos, por favor

   É um daqueles cafés charmosos, não muito arrumados, não muito comuns. O lugar é bem agradável e o cappuccino é delicioso. Está calor lá fora, eu sei. Mas é que ele realmente é muito bom. Pois bem. Estou sentada com um cara que conheci há pouco mais de uma hora, amigo de um colega meu. Ele disse que ia nos apresentar, marcou o lugar, a hora e voilà! Prático assim. Ele é interessante. Bonitinho, nenhum galã. Parece ser mais ou menos certinho. Nem o amor da minha vida, nem o cara dos meus sonhos, nem uma paixão avassaladora. Ainda bem, não estou com cabeça - nem coração - para essas coisas no momento. Podemos nos divertir juntos. Ele tem um papo legal, pelo menos nessa conversa de uma hora.    "Então, me fale um pouco mais de você", ele diz. Oh-oh, terreno difícil. Ele tem um sorriso encantador no rosto, e me incentiva a continuar. "Tenho 19 anos, uma irmã mais nova e pais superprotetores", eu digo. Essa parte é fácil de falar. "Não tenho certeza se estou

É o seu momento

   "Então, ele faz comunicação, a gente pega uma matéria juntos, e ele tava naquele barzinho que a gente foi na sexta... Depois que você já tinha saído, foi cumprimentar os meninos, sentou lá na mesa e ficou conversando. E aí ele pegou meu número, e agora me chamou para sair". Espero que ela continue, porque ainda não vi qual o grande problema da história. Íris e eu somos amigas desde a sétima série, e nos aproximamos ainda mais quando viemos juntas para a faculdade. Basicamente, ela sabe tudo da minha vida, como se estivesse presente em todos os momentos mesmo. Acho que eu também sei tudo da dela, porque, se aquele cara gatinho olha para ela, imediatamente ela faz o nosso sinal de comunicação interna e pronto, estou a par dos acontecimentos.    Incrivelmente, esse é um dos raros momentos em que não sei exatamente o que está acontecendo, porque meu celular quebrou na véspera do dia em que saímos, eu passei o fim de semana na casa de praia do meu pai - sinal de internet?

Nossa rede

   Ana gostava de Rodrigo, Rodrigo gostava de Ana. Mas Rodrigo também gostava de Luciana, Juliana e Mariana. Lucas gostava de Camila, que também gostava de Lucas, mas gostava mais de notas boas. Rafael gostava de Gabriela, mas ela gostava de cigarros, e ele odiava. Gabriela gostava de Rafael, mas ele assistia novela. Caio gostava de Tati, mas ele era Bahia, ela Vitória. Sabrina gostava de Antônio, que achava que gostava de Manu, mas na verdade era apaixonado mesmo por Fernando. Manu gostava de seus personagens de ficção, e ponto final. Gostar dava muito trabalho, porque as pessoas eram reais demais para serem de verdade.

Já fui tanto

   Hoje é um dia chuvoso. Tem dias que isso me dá vontade de chorar, tem dias que parece uma ótima oportunidade para assistir a uns filmes tomando chocolate quente. Já fui inverno, já fui verão, hoje me encontro interseção, vazio. Não aquele vazio melancólico, mas algo como uma página em branco. Uma página em branco, na frente de um escritor que está louco para preenchê-la. Uma página que parece querer voar nos olhos do escritor, dançar até as suas mãos e suplicar para que ele lhe dê uma história, um desenho, um sentimento.    Já fui a borboleta mais colorida a voar no céu, e também já fui aquela que preferiu ficar um tempo a mais no casulo. Já fui aquela flor de cor viva e pétalas macias, espalhando seu perfume e radiando alegria ao se exibir para o sol. Também já fui aquela flor murcha, quase marrom, as pétalas despencando como um peso insuportável. Hoje? Sinto-me como o botão ainda verde, esperando que a água, o sol e a primavera me libertem novamente às cores, aos perfumes e

Não acaba comigo

    "Ei, fica calma, Gabi". Eu tenho vontade de dizer que não me mandem ficar calma, que eu estou tentando, mas que é incrivelmente difícil, que minhas mãos não param de suar e que meu coração está acelerado, mas que eu não tenho como controlar nada disso. Não digo nada disso porque elas são minhas amigas, só querem o meu bem e estão falando essas coisas para ver se eu melhoro. Estamos as três no banheiro do primeiro andar da Faculdade de Administração, porque foi o primeiro prédio que eu vi quando abri a mensagem, no meu caminho para a segunda aula.    "Vai passar", Nanda fala baixinho, tirando uma mecha de cabelo que insiste em cair sobre meus olhos. Droga, eu sei que vai passar. Eu sei que daqui a alguns meses estarei completamente leve, que nem lembrarei como é sentir toda essa tristeza, que talvez até já conheça um outro alguém. Mas agora eu não consigo imaginar como é que em tão pouco tempo toda essa dor já terá passado, não sei como meu coração dilace

Tripulação, preparar para decolar

   Estou entrando no avião, e percebo que aperto muito forte a alça da minha própria mochila. Nossa, por que estou tão nervosa? Não, definitivamente não é a viagem. Já fiz isso tantas outras vezes. Justamente, eu penso, esperando que todos que estão à minha frente andem rápido para que eu possa me sentar logo. Mas por que diabos quero me sentar logo, se vou passar infinitas horas sentada e morrendo de vontade de levantar? É só a sua natureza contraditória, Lucy, eu repito. Encontro minha poltrona, 24A. Janela, óbvio. É melhor para refletir. Se bem que, hum, talvez seja melhor não pensar muito. Trouxe um livro comigo, e o tiro da mochila antes de colocá-la embaixo do assento da poltrona da frente.     Já sei porque estou nervosa. Essa viagem vai durar mais que as outras, vai me levar para um lugar completamente desconhecido. E não vai haver ninguém para me buscar no aeroporto. Acho que essa é a pior parte, ou talvez seja a melhor delas. Portas fechadas, desliguem os celulares. E