Ela olhou para ele. A história começa assim. Nada a mais. Nada demais. Ele olhou para ela. Aí sim, teve cena de filme romântico, câmera lenta, cabelos voando ao vento. Tudo imaginação, coitado. Ele achou que ela estava dando aquele olhar. Ela só estava com fome. E sabe como é aquele olhar perdido, desfocado, que parece concentrado em algo, mas na verdade só se concentra no "ai meu Deus, como eu queria uma coxinha"? Pois então. Ele sorriu para ela. Ela continuou pensando na coxinha. A história poderia terminar aí, mas entenda, aquele cara nunca iria deixar assim.
Ele foi atrás da recepcionista, descobriu nome e sobrenome. Sacou da sua arma - o celular - e pesquisou profissão, amigos e histórico escolar. Descobriu signo, ascendente, religião. Livros, blogs, férias de verão. Ela, faminta, continuava a olhar. Ele, encantado, não conseguia deixar de encarar. Ele tomou coragem, levantou da cadeira, andou até o outro lado da sala. Como todos ali, só podia esperar. Água, cafezinho ou aquele chocolate quente quase sempre ralo? Pegou dois copos, encheu de água e se dirigiu, enfim, à moça dona do tal olhar.
Aquele copo de água não era nada, claro que não. Assim como não era nada o leve gaguejar dele ao oferecê-lo. Assim como não era nada o susto que ela levou quando saiu do transe e o percebeu à sua frente, enorme e sem jeito. Nada daquilo se comparava ao sorriso que ele abriu ao vê-la sorrir. "Ahn, obrigada", ela respondeu, desajeitada. História de amor estranha por começar assim. Pena que aquele começo fosse um quase fim. A auxiliar do dentista apareceu na porta da sala de espera e chamou. O coração dele apertou. "Espera aqui, meu amor". A fome era tanta que ela, desatenta, ignorou.
Ele correu até a auxiliar e pediu que ela, por favor, tentasse esperar. Podia até, se fosse o caso, cancelar. Mas sabe como é, ele tinha um coração para conquistar. Apontou para a moça sentada, cabelo displicentemente jogado, olhos amendoados, lábios corados. A auxiliar sorriu. Era uma romântica incurável, coitada. Ele tomou ar, começou a andar, a postura elegante de quem sabia o que fazer. Por dentro, morria de medo de tremer.
"Oi, eu não sei o que te dizer", foi o que ouviu sua própria voz falar. Era algo que não conseguia controlar. "É só que quando te vi, sabia que era você. Acho que eu senti". Ela não entendia o que estava acontecendo. "Talvez você me ache estranho, apressado, sei lá...", sim, ela acharia, se conseguisse entender o que ele dizia. "Mas preciso do número do seu celular". E enebriada pela névoa da fome, pela urgência e sinceridade daquele rapaz à sua frente, ela simplesmente tirou um cartão da bolsa e o entregou. E assim, finalmente, nossa história começou.
Começa com ele dando bom dia, com ela tentando descobrir o que ele queria. E a conversa se alonga até meio dia, na sexta até meia noite, e a conversa transpõe o fim de semana e chega à quarta com uma vontade de falar mais, uma necessidade de perguntar, contar, de saber, de estar. E finalmente ele a chama para sair. E, pela primeira vez, ela, apreensiva, pensa em não ir. Mas quer tanto encontrar aquele estranho já tão conhecido, que arrisca e aceita, assim, com todas as cartas na mesa. Ela não sabe o que vestir, o que falar, como chegar ao lugar. Ele diz que pode buscar. E os dois erram o caminho, acabam por trocar o barzinho e sentar numa mesa de canto. Ela é só sorrisos, ele é só carinho. Os dois dividem o escondidinho.
E, se você ainda lembra, ela é a garota faminta que só pensava em coxinha. Se você imagina, ela não é o tipo que dividiria a comida assim, ainda mais de primeira. Pois bem. Quem diria que ela, algum tempo depois, viria a dividir a cama, a casa e as contas com aquele rapaz? Quem diria que ela, que morria de medo de cachorro, adotaria um lindo vira-lata? E quem diria que ele, que sempre morreu de medo de dentistas, acabaria por chamar o dentista e a auxiliar para lhe acompanharem ao altar? Não, ninguém diria nada disso. Ninguém imaginaria nada daquilo, nem poderia contar essa história direito. Porque, assim como esse começo era todo ao avesso, uma história dessas nunca poderia ter regras para ser contada. Nem teria, evidentemente, um final.
Ele correu até a auxiliar e pediu que ela, por favor, tentasse esperar. Podia até, se fosse o caso, cancelar. Mas sabe como é, ele tinha um coração para conquistar. Apontou para a moça sentada, cabelo displicentemente jogado, olhos amendoados, lábios corados. A auxiliar sorriu. Era uma romântica incurável, coitada. Ele tomou ar, começou a andar, a postura elegante de quem sabia o que fazer. Por dentro, morria de medo de tremer.
"Oi, eu não sei o que te dizer", foi o que ouviu sua própria voz falar. Era algo que não conseguia controlar. "É só que quando te vi, sabia que era você. Acho que eu senti". Ela não entendia o que estava acontecendo. "Talvez você me ache estranho, apressado, sei lá...", sim, ela acharia, se conseguisse entender o que ele dizia. "Mas preciso do número do seu celular". E enebriada pela névoa da fome, pela urgência e sinceridade daquele rapaz à sua frente, ela simplesmente tirou um cartão da bolsa e o entregou. E assim, finalmente, nossa história começou.
Começa com ele dando bom dia, com ela tentando descobrir o que ele queria. E a conversa se alonga até meio dia, na sexta até meia noite, e a conversa transpõe o fim de semana e chega à quarta com uma vontade de falar mais, uma necessidade de perguntar, contar, de saber, de estar. E finalmente ele a chama para sair. E, pela primeira vez, ela, apreensiva, pensa em não ir. Mas quer tanto encontrar aquele estranho já tão conhecido, que arrisca e aceita, assim, com todas as cartas na mesa. Ela não sabe o que vestir, o que falar, como chegar ao lugar. Ele diz que pode buscar. E os dois erram o caminho, acabam por trocar o barzinho e sentar numa mesa de canto. Ela é só sorrisos, ele é só carinho. Os dois dividem o escondidinho.
E, se você ainda lembra, ela é a garota faminta que só pensava em coxinha. Se você imagina, ela não é o tipo que dividiria a comida assim, ainda mais de primeira. Pois bem. Quem diria que ela, algum tempo depois, viria a dividir a cama, a casa e as contas com aquele rapaz? Quem diria que ela, que morria de medo de cachorro, adotaria um lindo vira-lata? E quem diria que ele, que sempre morreu de medo de dentistas, acabaria por chamar o dentista e a auxiliar para lhe acompanharem ao altar? Não, ninguém diria nada disso. Ninguém imaginaria nada daquilo, nem poderia contar essa história direito. Porque, assim como esse começo era todo ao avesso, uma história dessas nunca poderia ter regras para ser contada. Nem teria, evidentemente, um final.
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