Dois anos. Dois longos anos desde a última vez que te vi. Desde que você decidiu que aquela seria a última vez que eu te veria, mas preferiu não me avisar. Aquela vez em que nem o seu sorriso aberto conseguiu disfarçar a intenção do seu olhar. Dois anos em que eu lembrei, e senti, mas não chorei.
E aí eu fiquei sabendo, sabe-se lá por quem, que você estava namorando. Logo você, que sempre disse ter aversão a essa palavra. Logo você, que me olhava com cara de nada quando alguém perguntava "e aí? Vocês estão juntos ou o quê?". Logo você, que me apresentou à sua mãe pelo nome, sem nenhum adjetivo que desse pistas do que pensava sobre nós dois. Então agora você estava namorando?
Não é que eu tenha procurado saber. Mas é que o mundo é tão pequeno, e gira tão rápido, que um dia uma foto dela veio aparecer justamente no meu Facebook. Uma colega da faculdade, que comentou "quanto amor!" na foto que ela - e só ela - postou. Não foi como se uma faca se enfiasse no meu coração, realmente, eu juro que não. Só senti uma vontade histérica de rir, porque, sabe como é, lembrei do que você falava sobre essas fotos de casalzinho. Lembrei da cara que você fez para imitar a expressão dos caras das fotos, e de você dizendo que, se um dia, por milagre, viesse a tirar uma foto dessas, eu já ia saber que seria fingimento. É, eu sabia.
Isso foi no mesmo dia em que você me ligou. Três horas da manhã. Não sei se você lembra, mas meu sono é pesado, e é claro que eu não vi. E quando acordei, é claro que eu não ia retornar. E então continuei o meu dia normal, mas você continuou a me ligar. O que estava acontecendo? Acabei voltando para aquela foto dela. E visitei todo o seu perfil. Pela nova foto que ela postou - haja amor -, briga não tinha sido. Então, será que ela era parecida comigo? Ela gostava de piscina, mas tinha nojinho de areia. Praia, nem pensar. Frequentava um trabalho voluntário para salvar cachorros de rua. Tinha aulas de dança do ventre, e estudava para abrir consultório particular. Se estava com ela e lembrava de mim, de certo não era pelo meu amor à praia, meu medo de qualquer cachorro, minha inabilidade para dançar ou minha indecisão sobre o que fazer quando parasse de estudar.
Você continuou a me ligar. Não é que eu ainda quisesse falar com você, mas sentia um certo prazer em saber que você voltava a me procurar. E que eu não ia atender. Espero que o perfume dela seja igual ao meu, eu pensei. Espero que você lembre de mim até minha raiva acabar. Hoje faz dois anos que acabou. Não a minha raiva, mas o "algo" qualquer e sem definição - e, para você, sem importância - que um dia houve entre nós. E logo hoje, quando eu acabava de estacionar, imagine qual não foi minha surpresa ao te ver. Ali, acompanhado dela. E imagine a surpresa quando eu percebi que você estava vindo se aproximar. Sorrindo. E a minha expressão, ainda mais surpresa, quando você me apresentou a ela, me chamando de a sua "ex-namorada com quem você fez a maior burrada". E eu percebi que o perfume dela era bom, e que não tinha absolutamente nada a ver comigo. E ouvi você dizer que estava me ligando há dias, porque tinha consertado aquele notebook que ficava largado, e encontrado um rascunho do livro que eu disse que um dia ainda ia escrever. E foi aí que eu percebi que você mudou. E eu também. Passei meu novo e-mail para que você pudesse enviá-lo, elogiei o perfume dela, dei dois beijinhos em cada um e saí. Saí para onde a minha raiva por você não tivesse mais lugar.
P.S.: a imagem e a inspiração foram tiradas do projeto fantástico de Röra Blue, The Unsent Project. Você pode ver mais em www.rorablue.com
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