Pular para o conteúdo principal

Você não me ensinou a te esquecer



Eu me acostumei a ter você perto de mim, em todos os sentidos. Ouvia sua voz, admirava seus olhos, acariciava seu cabelo, dormia quentinha e protegida nos seus braços. Tudo parecia lua de mel e conto de fadas. Dava certo demais. Até que o nosso prazo chegou, e eu precisei ir embora. Mãos dadas, abraço apertado, chororô e soluços de despedida. A gente não tinha muita opção. Eu fui.
Então eu tive que me reacostumar a toda uma vida antiga. Com menos independência e liberdade, com menos tempo, mais tarefas e responsabilidade. E sem você, pelo menos fisicamente. A nossa ideia era terminar, mas não conseguimos. Algo ainda nos conectava de uma forma que eu nem tentaria explicar. E continuamos a compartilhar a vida. Assim, distantes, mas ainda tão presentes. Eu me acostumei à nova versão de você: das mensagens do bom dia ao boa noite, das ligações por vídeo, da saudade diária.
Eu fiz de tudo pra conseguir lidar com a saudade: trabalhei duro pra pagar passagens, mandei presentes pra além-mar. Mas às vezes a vida toma caminhos que nossas vontades não são capazes de mudar. Até hoje não decidi se acredito em destino. Se ele existe, tenho certeza que esse nosso encontro de almas estava previsto, e que tinha que acontecer. Aprendi tanto com você! Mas também aprendi, com nós dois, que não precisa de "pra sempre" pra valer à pena. Deu tão certo enquanto durou...
Depois, tive que aprender a me acostumar com a dor. E como aquele buraco machucou! Parecia mesmo que tinham arrancado um pedaço do meu coração. Hoje acredito que não foi arrancado: te dei de bom grado, e você me deu um pedaço do seu. A gente segue, a partir daqui, diferente do que era antes de se conhecer, se misturar e se modificar. 
A dor melhorou, estabilizou. A ferida não está mais aberta nem, muito menos, em carne viva. Vai sarando, aos poucos. Vai secando. Coisas do tempo. Agora, preciso me acostumar com o vazio que você deixou. Sumiu amor, sumiu conversa, sumiu ouvinte e apoiador. Tive que tentar compensar papeis. Fortalecer antigas amizades. Procurar ombros alheios para chorar. Ouvidos diferentes para contar de sonhos, pesadelos, medos e decisões. Outros números para compartilhar essas emoções.
Você não me ensinou a te esquecer. Mas eu sempre fui boa aluna, e mesmo sozinha, vou aprender. E o melhor de tudo é que, com essa memória boa que eu tenho, talvez nem precise esquecer pra conseguir superar.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Amor-passarinho

O amor precisa ser livre. Se não for, simplesmente não será amor. O amor precisa ser livre como passarinho. Precisa poder voar. Precisa ter a liberdade de construir outro ninho. O amor precisa ficar porque quer estar. Não adianta muito ficar apenas porque as asas cortadas já não conseguem voar.  O amor precisa ser livre - no início, no meio e no final - para que continue sendo amor, não posse. Precisa ser livre para poder se transformar, sem se prender em amarras. Só o amor livre consegue se transmutar em outras formas de gostar. O amor precisa ser livre, ainda que seja para voarmos para longe dele. É preciso perceber a hora de pousar, mas também a de ir embora. O amor livre é aquele que se alegra com os grandes voos do outro, mesmo que os ventos levem para outros caminhos. Gosto da metáfora do amor-passarinho: dos voos, dos ninhos, da beleza de poder ir, da sinceridade do querer ficar, da independência de conseguir planar sozinho.  Meu amor-passarinho vive d

Toda noite de insônia eu penso em te escrever

   Eu amava ouvir sua voz. E também amava ler suas mensagens e imaginar que estava ouvindo sua voz. Adorava o jeito que só você me chamava, as brincadeiras que só você entendia, as conversas que só a gente tinha. Eu escrevi tantos textos sobre você, e quase nenhum deles você chegou a ler. Tantas coisas eu pensei em te dizer, e você já não estava mais aqui para escutar.    Você sabe que eu costumo dormir fácil. Quando a aula está chata, quando o caminho é longo, quando ainda há dez minutos antes do próximo compromisso. Eu mal fecho os olhos e já estou dormindo. Mesmo assim, andei tendo umas noites de insônia, uns sonhos perturbados. Em quase todas elas, pensei em te escrever. Pensei em te contar da nova receita que eu aprendi, daquela minha amiga que terminou com o namorado babaca, da faculdade que anda uma loucura. Às vezes eu nem tenho nada para falar, mas ainda vem à cabeça aquele hábito antigo de pegar o celular, escrever nem que seja apenas “olá”.    Toda noite de insônia eu v

Nosso momento passou

   Já passou da hora de te dizer adeus. Já passou da hora de me virar, andar para longe sem olhar para trás. Já passou da hora de tirar suas fotos dos meus porta-retratos, de jogar as flores mortas fora, de tirar a água do jarro. Já passou da hora de guardar suas cartas, devolver o que você esqueceu em minha casa, quitar as contas dessa história.    Já deixei a hora passar algumas vezes, mas juro que agora é oficial! Coloquei no meu despertador e tudo. Preparei a sala, a mala e as lágrimas. Te espero com um jantar saboroso, um clima agradável, e te preparo para ouvir o que menos queria. Mas é que eu preciso. Nós precisamos, porque já não existe mais um nós vivendo sob isso tudo. Separei todas as suas coisas nessa mala, que assim você não precisa reviver os nossos momentos, nem os nossos ainda não-momentos, que não vão mais acontecer, só para recolher o que falta. Você não merece passar por esse sofrimento. Mas merece menos ainda ficar preso a algo que já deu tudo o que tinha de