Pular para o conteúdo principal

Quem é que tem coragem pra falar de amor?



Nessa rotina corrida, nessas cidades caóticas, nesses dias de cão, nessas relações líquidas, quem tem coragem pra falar de amor?
A gente não quer se expor. Mesmo que se exponha o tempo todo na internet. Mesmo que poste milhões de fotos nas redes sociais. Mesmo que conte da vida pro vizinho da cadeira do avião. A gente não quer se expor pra falar de amor.
A gente não quer se abrir. Mesmo que abra a boca pra falar besteira. Mesmo que abra a casa para visitas estranhas. Mesmo que abra a vida para desconhecidos. A gente tem medo de abrir o coração.
Nesse mundo de julgamentos, a gente não quer colocar os nossos sentimentos na balança do outro. A gente não quer se arriscar a deixar saberem que a gente sente. Como se a gente não sentisse. Como se não fosse humano.
A gente não quer se arriscar. Vive com medo de receber um não ou de ser mal compreendido. Tanto medo que preferimos não arriscar um sim. A gente aprendeu a não criar – ou não deixar que criem – expectativas, e nisso inibiu os sonhos e as possibilidades de futuro. Mas o que é a vida sem sonhos? É algo que só sobrevivemos, dia após o outro. Perde o sentido se não tem objetivo.
Essa inibição pra abrir – usar e admitir – o que vem do coração acaba enrijecendo todos nós. Ficamos duros, casca grossa, gelados. Nada nos toca. Nada é profundo o suficiente para atravessar nossas barreiras e finalmente nos alcançar.
E nesse cenário todo, nesses contatos sem toques, nesses olhares sem foco, nesses sorrisos sem cor, quem tem coragem pra falar de amor?
Eu.
Porque sei que isso faço bem. Porque gosto de fazer isso. Porque já ouvi dizer que meus textos acolhem alguns corações oprimidos.
Falo de amor porque é algo que toca todo mundo, em algum momento, de alguma forma. Falo de amor porque acredito na essência humana. Falo de amor porque sinto que ele dá sentido à vida. A gente precisa amar algo e alguéns pra ser feliz. A gente precisa se amar, precisa amar viver.
Eu tenho coragem pra falar de amor porque precisei de mais coragem ainda para vivê-lo. E porque vi que arriscar viver isso valeria muito à pena. Tenho coragem pra falar de amor porque, se eu não falar, as coisas parecem que vão explodir dentro de mim. Tenho coragem pra falar de amor porque essa energia simplesmente precisa fluir por mim.
E por que não tenho medo de me expor? Porque, pra mim, amor é coisa boa. E expor que sinto coisas boas pelas pessoas não poderia ser algo ruim. Por que não tenho medo de arriscar? Eu tenho, e muito. Mas aprendi na prática que alguns riscos valem à pena serem assumidos. Por que não tenho medo que pessoas específicas leiam minhas palavras? Porque se elas realmente me conhecem e me aceitam, entendem que preciso fazer isso. Escrever sobre amor, às vezes, parece necessidade física.
Eu tenho coragem para falar de amor porque, muitas vezes, eu não tenho opção.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Amor-passarinho

O amor precisa ser livre. Se não for, simplesmente não será amor. O amor precisa ser livre como passarinho. Precisa poder voar. Precisa ter a liberdade de construir outro ninho. O amor precisa ficar porque quer estar. Não adianta muito ficar apenas porque as asas cortadas já não conseguem voar.  O amor precisa ser livre - no início, no meio e no final - para que continue sendo amor, não posse. Precisa ser livre para poder se transformar, sem se prender em amarras. Só o amor livre consegue se transmutar em outras formas de gostar. O amor precisa ser livre, ainda que seja para voarmos para longe dele. É preciso perceber a hora de pousar, mas também a de ir embora. O amor livre é aquele que se alegra com os grandes voos do outro, mesmo que os ventos levem para outros caminhos. Gosto da metáfora do amor-passarinho: dos voos, dos ninhos, da beleza de poder ir, da sinceridade do querer ficar, da independência de conseguir planar sozinho.  Meu amor-passarinho vive d

Bicicleta ou casamento?

    Eu sou indecisão. Sinto muito se não foi assim que você planejou, mas eu simplesmente não planejei. Tudo bem, até que planejei, mas aí achei que o primeiro plano estava ruim, parti para o segundo, e devo ter chegado até o Plano Z, mas, bem, não deu muito certo. Então digamos que não foi planejado e pronto.    Eu tive que pedir opinião a trocentas amigas para me ajudarem a escolher entre o meu vestido preto, soltinho e costas nuas, ou aquele branco tubinho, quando você me convidou para o primeiro jantar com a sua família. E lembra o que eu acabei usando? Isso mesmo, aquela minha saia longa azul com uma blusa bege.    Eu não sabia se aceitava o sorvete de chocolate ou o picolé de amendoim naquele nosso primeiro encontro, e acabei tomando os dois. Eu não sabia se devia te dar a mão ou segurar o catavento que você comprou para mim, e então você mesmo puxou minha mão, com catavento, com suor frio de ansiedade e com uma gota do picolé que estava escorrendo porque eu não tinha

Eu voltarei a escrever

Soube hoje pela manhã que ontem foi dia do escritor. E precisava escrever e, principalmente, precisava vir aqui falar isso, depois desse jejum antiestratégico de alguns meses. Eu não sou uma escritora profissional – não vivo disso e nunca tive qualquer lucro com a escrita – mas emocional. Eu escrevo quando algo me desperta emoções, quando eu quero despertar emoções. E eu parei de escrever porque as emoções que eu podia catalisar – no meio de tanta dor e desespero, no auge da segunda onda da pandemia – não eram boas. Não quero ser um roteador de angústias e sentimentos ruins. A vida tem sido esquisita há um bom tempo: isolada do mundo, das pessoas queridas, dos grandes e bons momentos. Nada acontece aqui dentro. Lá fora, o mundo parece querer acabar. Me divido entre o tédio de não ter o que contar e o medo de assistir, de longe, o que pode acontecer. Parei de escrever. Mas escrever também tem sido a minha válvula de escape há anos. Eu escrevo sobre despedidas, partidas, dores, amores,